A COP30 e o desafio de comunicar as mudanças climáticas para o público
- kauric
- 3 days ago
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O mundo vai se reunir em Belém para discutir soluções para os impactos das mudanças climáticas e firmar compromissos políticos, mas o termômetro de euforia da população brasileira com o evento parece estar congelado. Nem mesmo a repercussão na mídia nacional e internacional, ou a expectativa de mais de 40 mil visitantes durante a conferência — entre cientistas, lideranças políticas e especialistas de renome —, tem sido capaz de aquecer o interesse popular sobre o tema.
E o paradoxo é evidente: pesquisas recentes mostram que mais de 90% dos brasileiros acreditam nas mudanças climáticas e consideram o evento importante para o país. Por que, então, tanta apatia diante de uma conferência que pode definir o futuro do planeta?
A ausência de um projeto claro e transparente de comunicação da ciência, tecnologia e inovação com a população é, sem dúvida, um dos principais fatores dessa distância. Sem um modelo de comunicação eficiente, grande parte das pessoas não investe tempo e nem energia para compreender temas científicos que afetam diretamente o cotidiano. Continuamos presos ao jogo de faz de conta: você finge que fala de forma clara e eu finjo que entendo e escuto.
Esse problema não é exclusivo do Brasil, é mundial. Mais uma vez, corremos o risco de ver um evento científico de extrema importância ser reduzido a debates restritos a um pequeno grupo. Pior: corremos o risco de transformá-lo em palanque para discursos políticos esvaziados. A falta de mobilização popular tem consequências graves e abre espaço para fake news, alimenta o negacionismo científico e fragiliza a capacidade da sociedade de cobrar gestores e políticos.
Enquanto líderes negociam em linguagem cifrada, a população recebe jargões, relatórios técnicos e manchetes rasas. É o paradoxo da comunicação climática: quanto mais urgente o problema, mais distante o discurso. Se a população não entende, não cobra. Se não cobra, governos não cumprem. E, sem cobrança, acordos viram papel.
A reflexão é simples: acreditar não basta. A crise climática não se resolve apenas com fé na ciência ou confiança em governos. É preciso traduzir, contextualizar e tornar acessível a partir de um modelo eficiente de comunicação da complexidade. Não basta convencer chefes de Estado; é preciso conversar com cidadãos comuns, envolvê-los emocionalmente de forma significativa. De nada adianta uma enxurrada de informações, dados e gráficos se a dona de casa, o agricultor, o estudante e o trabalhador não percebem que a mudança do clima já bate à porta: no preço da comida, na conta de luz, nas enchentes e na saúde da família. Sem um modelo de comunicação, a ciência vira monólogo.
Soluções existem. Pesquisas mostram que a forma de comunicar pode transformar a percepção pública. A Comunicação Pública de Conteúdos Complexos (CPCC) oferece métodos e algoritmos para simplificar sem distorcer. O Mapa de Atribuição de Relevância (MAR) conecta discurso e impacto social mensurável. Ferramentas como essas são oxigênio para que qualquer política climática saia do papel e seja compreendida e apropriada pela população.
A COP30 será o maior megafone do planeta. Mas megafones não funcionam sozinhos; alguém precisa ajustar a frequência. O maior inimigo do clima já não é apenas a negação, mas a incompreensão. O planeta não será salvo apenas nas mesas de negociação, mas nos espaços onde a comunicação realmente acontece.
A COP30 não precisa apenas falar a língua da população; precisa comunicar de verdade. Caso contrário, fará muito barulho, mas continuará sem voz. E, diante da crise climática, apenas fazer barulho é sinônimo de derrota. Que Belém não seja apenas o palco da conferência da Amazônia, mas o ponto de partida para um novo modelo de comunicação pública da ciência, da tecnologia e da inovação climática.
Sobre o autorAndré Kauric de Campos é jornalista científico e coordenador do projeto Comunicar Ciência. Atua na ponte entre conhecimento e sociedade, transformando temas complexos em conteúdos que informam, provocam e inspiram decisões mais conscientes.





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